terça-feira, 6 de março de 2012

Uma mão amiga

Era manhã de sol. O mês poderia ser qualquer um, não tinha tanta importância, assim como o dia da semana. Os pássaros cantavam alegremente nas árvores espalhadas pela cidade e, tudo parecia especialmente belo... Ela acordou cedo, talvez desperta pelo som do canto dos pássaros que entravam por sua janela entreaberta. Tomou um banho refrescante, vestiu um conjunto harmonioso, pôs um chapéu de cores alegres e saiu para a rua. Estava linda! Parou, olhou um lado depois o outro: A rua estava semi-deserta. Um ou outro transeunte circulava despreocupadamente... Ela não se importou com isso, queria sair de casa não importando para onde ir, mas tinha de sair. Quando ameaçou por o pé na pista, apressei-me e lhe estendi a mão. Eu estava com o coração acelerado. Ela, timidamente estendeu a sua e abaixou os olhos. Com vergonha talvez. Eu enchi o peito e levantei a cabeça. Estava orgulhoso. As árvores, os pássaros, os transeuntes... Nada disso tinha tanta importância. Só o fato de estar ali com ela atravessando a rua já me fazia o mais feliz dos mortais. Parecia uma eternidade: Eu, nos meus jovens 17 anos, conduzindo pela mão aquela mulher franzina e bela, que parecia estar flutuando ao vento. Sabia pouca coisa da sua vida e mais ela não deixava saber. Era só. Não tinha ninguém a esperar por ela, nem para conversar. Não sei por que estava calada. Eram motivos de sobra para disparar palavras sobre mim. Seria medo? Desconfiava de que eu não correspondesse? Parecia estar embevecida pelo cenário que nos circundava: Vez em quando levantava os olhos e observava as árvores. Estava tensa no inicio, mas, depois foi se acalmando a ponto de sorrir. Ficava mais bonita sorrindo, mesmo assim não falou palavras...
O vento começou a soprar um pouco mais forte. Ela sentiu frio, pois encolheu os braços e os colocou junto ao peito sem se dar conta que levou o meu braço junto. Toquei, sem querer, com as costas da mão, o seu seio. Ela estremeceu e olhou para mim como um pedido de desculpas. Aceitei com um aceno de cabeça e continuamos o passeio. Parecia uma criança diante de uma sorveteria: Sorvia cada paisagem como se estivesse saboreando um sorvete. Era muita emoção para uma manhã só. Estava ofegante quando chegamos do outro lado da rua. Seus olhos percorriam tudo como se estivesse ali pela primeira vez. E talvez estivesse... Tudo era novo e especial. Mas, ela se mantinha firme. Ficamos alguns minutos ali parados quando, ela deu-me um puxão delicado no braço mostrando que era hora de voltar. Refizemos o percurso. Ela tinha mudado: Agora estava alegre, de cabeça erguida... Parecia que no instante seguinte ia disparar a falar. Mas, não. Manteve-se como uma “Lady” ao meu lado. Quando chegamos perto de casa, desprendeu-se da minha mão e se voltou vagarosamente para o interior do quintal. Ao chegar ao limiar da casa voltou sobre os passos, olhou-me e disse: “Obrigada”. Entrou cambaleante e, antes de fechar a porta, a luz vinda do interior com o contraste da luz exterior fez os seus cabelos brancos cintilarem. Ela tinha 95 anos. Uma grande mulher...
Hoje, passados 40 anos, lembro-me dessa cena com saudades. Ela ficou no meu passado guardada com carinho e, fico pensando: Será que hoje, se eu precisar de uma ajuda que seja, uma mão estendida vou encontrar? Será que as pessoas estão atentas na rua? Não sei responder a essa pergunta. Mas, creio que quando eu estiver bem velhinho vai aparecer alguém para me ajudar a atravessar a rua e dar um passeio do outro lado da calçada. E com certeza vou me comportar como uma criança saboreando um sorvete. E, se acontecer com você, não se preocupe: Deus, Nosso Senhor nunca vai deixá-lo desamparado. Assim como aconteceu com aquela senhora, eu ou alguém estará lá. Pode estar certo....
Que o Senhor os abençoe abundantemente.
Amém!!!

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